“Se eu não falar, a língua queima em minha boca” (profeta Jeremias)

Por: Priscila Siqueira (Fraternidade de São José dos Campos e Litoral Norte Paulista)

Queridas/os irmãs e irmãos da Fraternidade Leiga de Charles de Foucauld,

 

O teólogo jesuíta Hans Küng- ( 1928/2021), considerado o mentor dos intelectuais católicos liberais, escreveu o livro “A Igreja tem salvação?”- (editora Paulus, 2012), onde faz uma crítica severa às estruturas eclesiais da Igreja Católica. Conforme seu testemunho, “Já  não posso calar com responsabilidade. A Igreja Católica está doente, talvez doente de morte. Retrógrada, euro centrada, fixada no elemento masculino, arrogando-se detentora da única verdade: assim se posiciona a Igreja Católica e, se continuar assim, ela não vai sobreviver”…

...“Contudo a visão de uma outra Igreja se mantém. Apesar das desilusões e dificuldades, mantenho-me fiel à Igreja Católica, minha Igreja tão provada”.

 

Um artigo publicado pelos jornais New York Times,

 Le Monde e Folha de São Paulo, de autoria de Hans Küng, mostra que ele era contra o celibato obrigatório para os padres. “No que tange aos Evangelhos, o celibato só pode ser afirmado como uma vocação de livre escolha e não como lei de aplicação geral”.

 

Para ele, o abuso sexual praticado por diferentes clérigos da Igreja, tem a ver com o celibato obrigatório, apesar de não ser sua única causa. “A regra do celibato, assim como o absolutismo papal e o clericalismo restrito se tornaram um dos pilares centrais do “sistema romano”.

 

Hans Küng que foi colega do Papa Bento XVI no curso de teologia, foi proibido em 1979 de ensinar essa matéria   na Universidade  de Tübingen, na Alemanha, por ter questionado do dogma da infalibilidade papal, aprovado no Concílio Vaticano I, em 1869-1870.“Deixemos a infalibilidade para Deus”, teria dito ele.

 

A crítica de Hans Küng à nossa querida Igreja de estar centrada no elemento masculino, é partilhada por muitos /as teólogas e teólogos, como Ivone Gebara, Irmã Zeca ou Leonardo Boff. Conforme o famoso mitólogo Joseph Campbell, “O que temos na Bíblia é um caso extremo da subjugação da mulher e entre nós ocidentais, isso se dá em decorrência do pensamento bíblico”.

 

O pensamento grego que teve grande influência na forma de pensar cristão, acreditava que a mulher era uma simples “chocadeira” do sêmen masculino. Para Aristóteles, a mulher era um homem mal-feito, como se quem a gestou tivesse tomado talidomida. Na sociedade grega, a mulher servia para gerar novos cidadãos. O verdadeiro amor seria dado por um outro homem.

 

 O óvulo só foi descoberto na primeira metade do século 19. Daí São Tomás de Aquino dizer que deveríamos amar mais o pai que a mãe, pois o pai era o princípio ativo e a mãe o elemento passivo numa gestação. A própria citação da Anunciação de Maria, pressupunha que Jesus teria sua origem unicamente divina. Ignora-se que Maria também contribuiu em seu nascimento, uma vez que como mulher, ovulava.

 

Santo Agostinho questionou se a mulher teria salvação pois, feita da costela de Adão e não por Deus, ela talvez não possuísse alma. Mas pensando em sua querida mãezinha, ele decidiu que a mulher teria salvação se casasse com um homem (por pior que ele fosse…) ou se casasse com Deus.

 

Pela leitura bíblica, até o “dar a vida” foi tirado da mulher. Foi Adão, um homem, que de sua costela gerou um outro ser humano, a mulher.

 

Segundo nossa fundamentação religiosa, a mulher por sua natureza com seu corpo, sensualidade é o ícone da carnalidade, portanto da morte e do pecado. O masculino nos levaria para o alto, para a glória divina. O feminino, para a morte e degradação.

 

Será que tal pensamento não permeia nossa Igreja ainda hoje em vários de seus setores?!... Certa vez, um sacerdote amigo meu, confessou que muitos padres têm medo de mulher…Daí excluí-la de sua presença e de suas decisões dentro da Igreja. É só averiguar como um seleto grupo do clero masculino  decide sobre a vida e sexualidade dos leigos, sendo que estes -em sua maioria- são compostos pelas mulheres.

 

Papa Francisco, o latino-americano que “veio de longe” para os italianos, quer mudar tal situação. Tomara Deus que ele consiga. Hans Küng, para mim um dos profetas da Igreja atual, iria ficar muito contente…

 

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